Ao oferecer o relógio de parede para marcar o Dia do Professor, o Sindprof dispõe neste espaço uma bela reflexão produzida pela professora Dra Eli Fabris, especialmente escrita para nós que escolhemos o magistério como profissão.
O relógio talvez seja o instrumento que melhor representa a vida em uma escola. Hora de chegada, hora do recreio, hora da aula, hora da merenda, hora da saída...
É importante observar que esse é etambém o instrumento que toda sala de aula expõe como um troféu em suas paredes. O relógio exposto parece um controlador que assegura que tudo será feito como deve ser feito, no tempo determinado. Tudo sob controle, nada fugindo ao olhar dos ponteiros e do tique-taque certeiros que não perdoam atrasos, enganos, erros. A vida de sucesso é para os talentos que sabem obedecer às ordens do senhor do tempo.
Haveria outras formas de vivermos o tempo na escola e da escola? É o relógio que controla o tempo?
Já estamos vivendo e marcando outros tempos na escola, pois a vida contemporânea se impõe com outra lógica social, cultural e econômica sobre as pessoas que vivem a escola e da escola. A quantidade de ações que conformam a trama em que se veem enredados os protagonistas desse lugar – alunos e professores – parece ter se expandido na contramão dos resultados das avaliações exigidas. A produção que se exige do professor e, por conta disso, também dos alunos é imensa frente ao que se exigia no tempo do surgimento da locomotiva.
Se prestarmos atenção aos tipos de relógios, vamos perceber que eles também mudaram – relógio orientado pela posição do sol, relógio analógico, relógio digital. O tempo, antes marcado pela posição da sombra, depois por ponteiros que se deslocavam, mostrando os segundos, minutos e horas, agora é apenas o presente – nada há para visualizar nem para frente nem para trás. O relógio digital é a marca do tempo presente, da escola presente.
E o relógio continua a ser uma tecnologia atual, poderosa, que tem sobre os sujeitos deste tempo uma implacável ação. O que ele tem produzido sobre nós? O relógio não tem a condição de mudar o tempo, transcender o tempo ou deixar de marcar o tempo, pois é uma máquina. Como tal, precisa ser acionado pelo humano, utilizado pelo professor e pelo aluno. O professor não poderá mudar a marcação do tempo, mas poderá criar a vida que preenche o tempo na escola e da escola. O aluno poderá viver esse tempo embalado pela vida que foi sonhada para ser vivida nesse espaço temporal para o conhecimento. O tempo, como construção social, precisa ser conduzido para os fins que só o humano pode determinar, jamais uma máquina. A pulsação do tempo não é dada pelo relógio, mas por quem vive as marcações do relógio. Esse é o tempo social, o tempo que não vemos passar, pois se transforma em diálogo, parceria, invenção, experiência, experimento, vida que corre entre ponteiros ou marcações digitais, não importa, obedecendo a outras razões que não apenas a econômica, do lucro, da concorrência e do mercado.
No entanto, neste tempo da aceleração, do trabalho de alta performance, da celebração dos resultados e do esquecimento dos processos vividos, o relógio só pode marcar as horas e os minutos da e na escola de forma cada vez mais acelerada. Isso porque há uma ordem vigente que perturba o relógio e cria um tempo outro, um tempo que produz a insatisfação, a desigualdade, a saturação, a exploração do trabalhador, e que se rende à velocidade do tempo rei da sociedade neoliberal.
Essa ordem vai acelerando o tempo e vai exigindo cada vez mais do professor. Ele já não consegue ensinar embalado pelo tique-taque do relógio, que parecia ampliar o tempo do conhecimento, da experiência, da troca, do estar junto, da cumplicidade com seu aluno. Agora, quando ouve o sinal, o professor precisa despejar sua aula em tantos minutos e, novamente, ao ouvir o sinal, já é o final da aula; ele salta não mais de uma sala para outra, mas de uma escola para outra, de uma função para outra. Nos finais de semana, em seu “tempo livre”, precisa dar conta da burocracia que a tal “ordem” produz e que faz o relógio correr compulsivamente. Controlado pela tal “ordem”, o professor ainda espia o relógio, tem vontade de brigar com ele, jogá-lo para bem longe de si... Mas, se o faz, ainda tem o celular, que também marca o tempo; tem e-mails acumulando na caixa de mensagens, que logo estará lotada; tem o aplicativo indicando o que ele não pode esquecer; tem o compromisso no Facebook... Sim, as redes sociais também estão a serviço da marcação e do preenchimento do tempo. Então, em meio a tudo isso, é possível parar e colocar-se a pensar?
Haveria outras formas de vivermos o tempo na escola e da escola? É o relógio que controla o tempo?
Profa. Dra. Elí T. Henn Fabris
Nenhum comentário:
Postar um comentário