Laura Fonseca, professora da Faculdade de Educação da UFRGS, gratificou a quem dirigiu-se ao auditório do Colégio Estadual 25 de Julho, no final da tarde do dia 23 de outubro, com sua agradável e reflexiva palestra sobre Gestão Democrática.
Professoras e professores da rede pública municipal e estadual, alunos e alunas do magistério do Colégio 25, sentiram-se muito à vontade para questionar e contribuir com as reflexões da profª Laura, que pesquisa sobre Trabalho, Movimentos Sociais e Educação.
Embasada em documentos como a Constituição Federal de 1988, Plano Nacional de Educação, Conferencia Nacional de Educação e a carta do Encontro Nacional de Educação, a professora apresentou um histórico dos movimentos sociais e acadêmicos em defesa da escola publica de qualidade.
Retomando o período dos anos 80, no qual a ênfase das políticas públicas educacionais se focam nos convênios com entidades filantrópicas entre outras, surge o movimento social das creches conveniadas que, ao contrário do que ocorre na década de 60 e 70, deixam de ter caráter assistencial. A partir das Conferências da Educação, estruturação de Conselhos e da Participação dos cidadãos, surge a expressão: Gestão Democrática.
A Gestão Democrática, surgida nesta época, propõe condições de trabalho a partir da tomada de decisão do “usuário” (o cidadão, contribuinte, trabalhador). Através da organização por prioridade, qualidade e autonomia, o gestor faria o papel do estado e assim, descentralizaria o poder. Em sua definição primária, a gestão democrática utilizaria como indicador de qualidade a avaliação das propostas elencadas anteriormente.
No entanto, a partir da ideia neoliberalista, há a necessidade de enxugar os recursos públicos e reinvestir na reprodução do capital. Assim, ao invés de investir nas políticas públicas se passa a investir em “políticas de governo”, sucateando as escolas públicas, investindo dinheiro público nas empresas privadas e terceirizações e retirando direitos dos trabalhadores.
A partir das terceirizações na educação, as empresas e organizações privadas passam a assumir o papel de responsáveis pela formação dos professores. O que seria dever do estado: ofertar o ensino público gratuito a todas as esferas da educação, da educação infantil à pós-graduação, se transfere para o ensino privado, que garante seu financiamento sem precisar de recursos próprios e com condições de disseminar sua ideologia capitalista. Com o discurso ideológico da democracia, a Gestão Democrática chega aos tempos atuais carregada de atravessamentos, discursos e práticas que estão aquém da sua proposta social inicial.
Desta forma, tem sido travada uma luta em contraposição ao neoliberalismo que enxuga os investimentos nas políticas sociais. Planos de carreira são extintos e a ampliação da formação dos professores não gera o reconhecimento legal, que seja atrativo para a permanência na docência. Recursos para a educação chegam na forma de projetos, transformando a escola como lugar para ficar, mas sem o compromisso com o aprender e produzir conhecimento.
A escola tem sido também um lugar de adoecimento de seus profissionais, com menos servidores públicos e mais contratações temporárias. Estagiários extrapolam o acompanhamento de crianças com necessidades especiais, passando muitas vezes a assumir o exercício da docência no lugar do professor em licença, ou o professor aposentado. A pesquisadora constata em seus estudos e na militância na ANDES (Associação Nacional de Docentes) a exploração do trabalho desses jovens em formação, seja pelos valores pagos ou pelo exercício precoce da docência.
Assim, se houve uma ampliação das vagas nas escolas públicas, a pergunta que se faz é com que qualidade se oferta aos alunos?
Laura Fonseca fala em inclusão excludente, pelas políticas de governo com várias possibilidades de privatização, que retiram direitos e compactuam de forma indireta com a exploração do trabalho na escola. São os estagiários, os oficineiros do projeto Mais Educação, ou do projeto Escola Aberta, as profissionais da merenda e da limpeza, com contratos temporários e/ou terceirizações sem os mesmos direitos de um profissional estatutário. Disso se pode afirmar que, se pesquisas comprovam a ampliação da classe trabalhadora na escola, esse direito ainda permanece desqualificado. Nem estrutura, nem profissionais satisfeitos, o suficiente para atender a demanda de uma escola pública de qualidade. Constata-se a precarização do trabalho docente e a mercantilização da vida.
Uma escola de Gestão Democrática constrói e executa o Projeto Político Pedagógico e não apenas gere cifras. Exige a participação coletiva de seus profissionais e de sua comunidade para definir a escola que se quer, para de fato gerar aprendizagem na escola, contrapondo as imposições de aprovação automática.
Como discutir o Projeto Político Pedagógico na escola com tantos atravessamentos? De que forma é possível oferecer a educação para a reflexão e autonomia em um espaço que explora o jovem trabalhador, os funcionários e servidos em situação desigual? Como executar o PPP em meio a tantos planos de governo que ocupam o tempo dos professores e os afastam do pedagógico? Que autonomia é essa, incluída na meta 19 do Plano Nacional de Educação que se insere com apostilas, pactos, índices, méritos e desempenhos?
Na concretude da escola, com os atropelos de projetos e precarização do trabalho, ainda nos deparamos com a ausência de democracia na gestão. Mas, nas sábias palavras da professora Laura, é na luta que se muda a vida. As conquistas se dão pela forte organização de entidades/categorias, pela defesa da escola pública e da qualidade da educação.
2 comentários:
ADREI A REFLEXÃOOOOO
É ISSO MESMO QUE ACONTECE
Eh fácil criticar sem ocupar os espaços de representação política, por isso venho justificar aqui o porque da minha ausência no Seminário de Gestão Democrática Escolar promovido na quinta-feira passada (23/10) pelo Sindprof-NH.
Não me considero suficientemente politizado, mas tive a oportunidade de vivenciar a transição do antigo modelo de gestão autoritário vigente ate o final do século passado, para o modelo de gestão democrática introduzido nas instituições de ensino no limiar do século XXI
Dentre todas as experiências político-pedagógicas que tive durante minha existência, que não foram poucas nem desimportante, nenhuma delas tive o infortúnio de presenciar tanto desrespeito aos princípios democráticos de gestão publica e ao direito de uma educação de qualidade, quanto os que vivenciei nesses três anos dentro dos muros de uma escola da periferia urbana miserável de Novo Hamburgo, justamente numa situação de alinhamento ideológico progressista!
Por isso, independentemente do matiz ideológico de quem se encontra no poder, penso que são condições sine-equa-non para que a gestão escolar democrática se torne uma realidade:
- A integridade ético-profissional da equipe diretiva.
- A transparência na coordenação dos encontros de planejamento coletivo.
- A contemporaneidade, fidelidade e socialização dos registros desses encontros.
- O respeito ao direito de participação na construção da pauta de discussão.
- O respeito a liberdade de manifestação individual.
- O respeito a diversidade de opinião.
Prof. Julio Konrath
EMMEF Eugenio Ritzel
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