Paulo Saldaña
A cada dia, oito professores concursados desistem de dar
aula nas escolas estaduais paulistas e se demitem. A média de pedido de
exoneração foi de 3 mil por ano, entre 2008 e 2012. Salários baixos, pouca
perspectiva e más condições de trabalho estão entre os motivos para o abandono
de carreira.
A rede tem 232 mil professores - 120,8 mil concursados, 63 mil
contratados com estabilidade e 49 mil temporários.
A fuga de
professores também é registrada na rede municipal de São Paulo, mas em menor
escala. As escolas paulistanas têm média de 782 exonerações por ano desde 2008.
Proporcionalmente ao
tamanho das redes, o índice no Estado é duas vezes maior. Além disso, a capital
conseguiu ao longo dos anos ampliar em 12% o número de efetivos, enquanto a
rede estadual tem 10 mil concursados a menos do que em 2008.
Os docentes que
abandonaram o Estado migraram para escolas particulares, redes municipais ou
dão adeus às salas de aula. O bacharel em Educação Física Marco
Antonio Uzunian, de 30 anos, decidiu ser instrutor de uma academia e hoje
também trabalha em uma empresa.
Apenas um ano em uma
escola estadual na Vila Carrão, na zona leste da capital, foi suficiente para
ele desistir. Uzunian é um dos 2.969 efetivos que pediram exoneração só no ano
passado. É o maior índice desde 2008. "Na escola eu não conseguia tocar um
projeto de verdade, não tem apoio nem companheirismo", diz.
O bolso pesou na
decisão. Depois de concursado, só pôde pegar uma jornada de 10 horas. "Eu
não tive opção de jornada maior. Essas 10 aulas me rendiam R$ 680." A
Secretaria da Educação não respondeu por que há limite de jornada para novos
docentes.
Crise. Nem a estabilidade
do funcionalismo público tem impedido demissões. Formado em Matemática pela
Federal do Paraná, Fabrício Caliani ingressou na rede estadual em 2004.
Abandonou em 2009 para ficar em escola particular. "Escolhi ser professor
por vocação e faço meu trabalho bem feito. O que eu ganhava até me aposentar
não ia compensar enfrentar
tudo isso", diz ele, que dava aula em Bastos, no interior paulista.
Mesmo sem ter emprego em vista, Eduardo Amaral, de 39 anos,
pediu exoneração em abril de 2012 - depois de 8 anos na rede. "Para além
da questão do salário, jornada e condições de trabalho adversas, tem o dia a
dia da escola. É um ambiente hostil", diz ele, que hoje trabalha na Câmara
Municipal de São Paulo.
Professor da
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Romualdo Portella
considera os dados muito altos. "Temos reconhecido que a questão-chave da
educação é o professor, mas precisamos ter atratividade de carreira, boa
formação, retenção e avaliação", diz.
A Secretaria da
Educação defendeu que o número de exonerações representa só 1,63% do total de
efetivos. Em relação à diminuição do número de efetivados, a pasta argumentou
que aposentadorias, mudanças e mortes devem ser levados em conta. O governo não
informou quantos concursos realizou desde 2008.
Falta de interesse pela carreira de professor é comum em todo o País
A questão docente não é uma preocupação apenas do Estado de São
Paulo, mas um drama vivido em todo o País. Estimativa recente aponta déficit de
170 mil professores de Matemática, Física e Química. Mas estatísticas do
Ministério da Educação (MEC) revelam uma situação ainda mais grave: o número de
interessados em ser professor está caindo a cada ano, o que torna mais difícil
suprir as demandas.
De 2006 a
2011, o número de alunos que entraram em Licenciatura e Pedagogia caiu 7,5%. Em
2011, último ano em que os dados estão disponíveis, foi registrado o menor
volume de pessoas que ingressaram nesses cursos desde 2004. Foram 662 mil
matriculados em cursos presenciais e na modalidade a distância em todo País.
O total de diplomados interrompeu crescimento registrado entre
2000 e 2009. Desde então, já apresentou queda de 11%. Em 2011, 358 mil pessoas
formaram-se em Licenciatura ou Pedagogia, formação padrão para atuação na
educação básica (do ensino infantil ao médio). Apesar de desaceleração no ritmo
de formação, o número de professores no País tem aumentado nos últimos três
anos. Em 2012, existiam 2,1 milhões de docentes de educação básica.
A superintendente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação
(Cenpec), Anna Helena Altenfelder, lembra de pesquisa recente da Fundação
Carlos Chagas (FCC) que mostra que os jovens não querem ser professores.
"O estudante do ensino médio respeita o professor, mas diz ‘eu não quero’,
porque ele vê a dificuldade e a vida dos docentes", afirma. "Há uma
questão da precarização da atividade: do salário, progressão na carreira à
valorização social do magistério."
Perfil. Com esse contexto negativo, a carreira docente não tem atraído,
em geral, os alunos com melhor desempenho no ensino médio. "O Estado de
São Paulo, por exemplo, tem 98% de seus professores formados nas instituições
privadas, que em geral têm as piores condições, professores menos qualificados
e formam mal o aluno", diz o professor de Educação da USP Romualdo
Portella.
Dados de levantamento da FCC revelam que 39,2% dos
professores do País são de famílias de baixa renda (de até 3 salários). Além disso, 45,6%
dos professores têm mães com nenhuma escolaridade ou que cursaram apenas até a
4.ª série.
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