quinta-feira, 24 de julho de 2014

IPASEM: o poço sem fundo

O IPASEM (Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores Municipais de Novo Hamburgo) foi criado em 24 de dezembro de 1992 (Lei 154) pelo então prefeito Paulo Ritzel (PMDB). O IPASEM surgiu a partir de demanda criada pela luta dos trabalhadores que desembocou na Constituição de 1988. Ali se estabeleceram novas regras para o serviço público, como a obrigatoriedade do concurso e o regime previdenciário próprio.

Das contribuições

A
tualmente o os trabalhadores recolhem para o IPASEM 11% do salário e a Prefeitura, tendo como referência o mesmo valor, recolhe 14,6% e mais um recolhimento especial de 2%. 1,3% destes percentuais é previsto para despesas de administração, portanto os rendimentos dos investimentos são específicos para a aposentadoria, pensão e assistência.

A lei nº 1312, de 28/10/2005, artigo 19, parágrafo 2, determina que “A transferência dos valores suficientes (os percentuais recolhidos dos salários e a parte da prefeitura) para a cobertura da folha de proventos de pensão e aposentadoria de que tratam os §§ 1º e 2º, dar-se-á até o 10º (décimo) dia útil do mês de competência.” Segundo o Portal da Transparência, foi pago ao IPASEM em 2013 a título de Aposentadorias, Reservas Remuneradas e Reformas R$46.359.757,36 e R$4.515.424,75 a título de Pensões.

Dos conselhos

O
Conselho Deliberativo do IPASEM é composto por nove membros: cinco indicados pelo Grêmio Sindicato e quatro pelo Prefeito. As indicações do Grêmio estão ligadas a sua própria eleição: troca a diretoria do Grêmio, trocam os representantes no Conselho (não necessariamente). Já a troca dos representantes da prefeitura está relacionada as eleições municipais e a conjuntura política do momento (acordos com aliados).
Quem nomeia os representantes é o Prefeito, mesmo os indicados pelos trabalhadores, assim como o Diretor Presidente e o Administrativo. Lei Completar 07/2011, Artigo 7, Parágrafo 4: “O ato de nomeação dos membros da Diretoria Executiva é prerrogativa do Prefeito Municipal”.

Existe também o Conselho Fiscal, composto por três membros: um indicado pelo Prefeito, um indicado pelo Grêmio Sindicato e outro indicado pela Câmara de Vereadores. A legislação prevê que estes três devem ter formação pertinente ao exercício do cargo, o que torna a lei de autoria do Vereador Farias (PT), aprovada recentemente e que estabelece formação para os indicados, demagogia inútil: Artigo 12, § 4º: “A indicação dos membros do Conselho (Fiscal) recairá, obrigatoriamente, em pessoas diplomadas em cursos de técnico-contábil e/ou de nível universitário nas áreas de ciências contábeis, econômicas ou jurídicas”.

O inciso II da Lei 1404 de 2006, determina que “5 (cinco) membros representantes dos Servidores Públicos Municipais, indicados por entidade classista dos municipários, dentre Servidores Municipais estatutários e/ou Servidores detentores de estabilidade constitucional, sendo, pelo menos um deles, Servidor inativo vinculado ao instituto”.
Entretanto, a Administração não reconhece o Sindprofnh como representante legítimo de uma parcela dos servidores e nega-lhe assento no Conselho, mesmo os professores sendo a maioria da categoria – 1900 professores e 1400 do quadro geral. Todos são indicados pelo Grêmio Sindicato, mesmo a Lei não definindo essa exclusividade. O problema, portanto, não está na redação da lei, mas numa interpretação conveniente para a Administração.

Compete ao Conselho Deliberativo (Artigo 5°), entre outras coisas, “Aprovar as propostas orçamentárias e deliberar sobre as destinações das receitas, recursos e demais rendas auferidas pelo Instituto, nos termos desta Lei;” e “Fiscalizar a gestão dos Diretores em todos os assuntos e matérias de interesse da entidade, examinando livros, documentos, papéis, solicitando informações sobre quaisquer atos celebrados ou em vias de celebração, ou outros elementos e esclarecimentos necessários ou julgados convenientes, a qualquer tempo”. Aqui vale a regra de que o desconhecimento não isenta de responsabilidade o agente. Aliás, onde estavam os conselheiros que não fiscalizaram os investimentos?

Sobre o Fundo TrendBank

O
ex-diretor do IPASEM, Valnei Rodrigues, esteve na Câmara de Vereadores na segunda-feira, 21, para dar esclarecimentos sobre as perdas milionárias do Instituto a partir de investimentos feitos em sua gestão (2004/2011). O ex-presidente negou as afirmações que estão sendo feitas a respeito dos problemas.
Aqui o link para a matéria no Portal da Câmara de Vereadores:

http://portal.camaranh.rs.gov.br/noticias/ex-diretor-do-ipasem-responde-a-questionamentos-dos-vereadores

Dos fatos

V
alnei disse que os investimentos feitos em fundos privados e que ocasionaram as perdas foram autorizados em Ata. A direção do IPASEM informou que os documentos estão acessíveis a todos, basta procurarem o Instituto. O Sindprofnh obteve acesso aos documentos e nada encontrou. Apenas na Ata 414 o ex-diretor Nelson Denicol informa que o IPASEM abrirá contas em alguns bancos, onde o Banco Safra é citado. Não há qualquer tipo de autorização para a compra de cotas em fundos privados, até porque esta não é uma função dos Conselhos, que apenas aprovam ou não as políticas de investimento. A decisão das aplicações específicas é atribuição exclusiva dos diretores, portanto a responsabilidade é única deles.

Valnei negou, a partir de questionamento do Vereador Issur (PP), que os recursos aplicados no FIDC TrendBank haviam sido retirados de outros fundos que estavam rendendo mais em bancos públicos. Infelizmente Valnei negou algo que é perfeitamente comprovável por qualquer pessoa. Basta acessar o site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Este é o link: http://cvmweb.cvm.gov.br/SWB/defaultCPublica.asp
Ao acessá-lo, basta colocar o CNPJ do fundo em questão. Estes são os CNPJ´s dos fundos de onde os recursos foram retirados:

BANRISUL PREVIDÊNCIA MUNICIPAL FI RF LP - CNPJ: 08.960.975/0001-73
BANRISUL PREVIDÊNCIA MUNICIPAL II FI RF LP - CNPJ: 10.199.942/0001-22
CAIXA FI RS TP RF LP - CNPJ: 05.164.364/0001-20

Observem que estes fundos, além de serem administrados por um banco público, também são destinados especificamente para os institutos de previdência municipais.

Este o CNPJ do FIDC TrenBank:

FIDC TRENBANK BANCO DE FOMENTO MULTISETORIAL - CNPJ: 08.927.488.0001-09

Para calcular a rentabilidade de um fundo em determinado período, basta fazer o seguinte cálculo: valor da cota final / valor da cota inicial - 1 * 100.

Das provas

V
alnei tentou jogar o problema para a atual direção, dizendo que em 2013 foram perdidos R$20 milhões. A informação carece de provas. O que existe é que o IPASEM perdeu em 2013 cerca de R$ 9 milhões, mas por conta da queda da Bolsa de Valores no ano passado, onde todos os investidores perderam. É o que chamamos de risco de mercado, esperado no mercado de ações. A perda proporcionada pelo tipo de investimento feito por Valnei é o que se chama de risco de crédito, quando as perdas são específicas daquele investimento (quando a empresa quebra). Para evitar o risco de crédito, é fundamental a análise dos prospectos dos fundos e do histórico da empresa da qual se compra as ações.

Neste caso, evidentemente, houve, no mínimo, pouca cautela de Valnei, já que em 2009 um outro fundo (FIDC Creditmix) do mesmo banco e com o mesmo perfil, perdeu 100% do patrimônio, em torno de R$100 milhões. Esta informação já era pública na época que Valnei comprou as cotas do Trenbank. Ou Valnei estava muito mal informado, ou agiu motivado por outras razões além dos rendimentos oficiais oferecidos.

Dos investimentos

V
alnei também argumentou que as cotas eram resgatáveis. Mais uma vez a informação pode ser desmentida pelo simples acesso ao prospecto do fundo, disponível na internet. Na página 31 consta a informação do prazo de vencimento das cotas de 2ª série (cota adquirida pelo IPASEM), que era de 120 meses (10 anos) a partir da primeira integralização, que ocorreu no ano de 2010. No regulamento do fundo FIDC Trendbank, no artigo 45°, consta a informação sobre o resgate das cotas. Artigo 45: “Não haverá resgate de Cotas Seniores, a não ser pelo término do prazo de duração de sua respectiva emissão/série do FUNDO, ou pela liquidação do FUNDO.”

Este o link: http://www.cvm.gov.br/dados/ofeanal/RJ-2011-06467/20110718_PROSPECTO.pdf

A única possibilidade de resgate seria no que se chama de “mercado secundário”, onde se deve ter um investidor qualificado (regra da CVM) para a transação. Mas aí é como você vender o seu carro que foi roubado, ou seja, você só entrega os documentos do veículo. Quem faria esta compra? Talvez por um Real alguém o compre.

Mas o problema ainda não acabará quando o Fundo for liquidado, pois ainda será preciso pagar as despesas de administração do fundo, que será dividida entre os investidores. Isto é, tem mais prejuízo ainda.

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