quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Relatora da PEC do Fundeb prevê que maior desafio é convencer União a aumentar financiamento

Ela destaca que o texto atual é uma combinação das versões anteriores com o texto de duas PECs sobre o Fundeb que surgiram no Senado em 2019, sob a relatoria do senador Flávio Arns (REDE-PR). “O texto que eu apresento é um texto consertado, combinado, entre eu e ele. Isso é inédito. A gente nunca teve um avanço do ponto de vista legislativo de ter um texto unificado”, diz.
Segundo ela, o texto corrige distorções no modelo atual. “Pelo modelo atual, a complementação [do governo federal] chega a apenas sete estados do nordeste e dois estados do norte. Isso porque a lógica do Fundeb é complementar os estados cujo o per capita não atinge o mínimo definido nacionalmente. A proposta é corrigir para que os municípios que tenham os menores per capita, que são os mais pobres, independente de estarem em um estado que não receberia, vão receber”, diz.
Ela cita nominalmente o caso de Alvorada, município da região metropolitana que tem um dos menores índices de desenvolvimento do País e, pela regra atual, não recebe recursos federais do Fundeb. “Em teoria, o RS seria um dos últimos estados a receber recurso federal, mas não podemos dizer que a situação da educação aqui está resolvida, nem no âmbito do Estado, nem dos municípios. O município de Alvorada é um município pobre que precisa de ajuda. Ele recebe complementação, mas do Estado e de seus municípios mais ricos. A União não vai nunca colocar nada de dinheiro novo nessa realidade? Então, a proposta do Fundeb é criar um processo permanente na Constituição, mas criar condições, do ponto de vista legislativo, para os municípios mais pobres e que precisam de apoio para melhorar resultado”, diz.
Dorinha afirma que o seu texto previa a ampliação da complementação federal para 30% em nove anos, de forma gradativa. Os 40% vem do texto do Senado, que foi assinado por governadores, secretários estaduais e municipais de Educação, com autoria de Davi Alcolumbre (DEM-AP), atual presidente do Senado. “Esse percentual seria compatível com o desenho tributário que nós temos. Muita gente acha que o Fundeb é federal, mas hoje 90% do fundo vem de estados e municípios. A União põe 10% para sete estados do nordeste e dois da região norte. Então, para um fundo nacional dessa proporção, o desenho está errado, precisa ser revisto”.
Ela diz que há algumas fontes previstas de financiamento para que se alcance os 40% de complementação do governo federal, a principal delas são os royalties do pré-sal. A PEC também busca garantir na Constituição que o fundo vai ser financiado com recursos dos royalties gerados pela extração de petróleo e gás. “A gente tem muito receio de perder essa fonte, que é recente e vai crescer muito. Todo mundo está contando com esse dinheiro. Já tem uma lei que definiu que é 75% para a educação e o restante para a saúde. Então, nós estamos assegurando”, disse.
Segundo ela, a própria Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) apresentou documentos que apontam para o crescimento de recursos a serem transferidos para o Ministério da Educação, isto é, de recursos que já estão previstos para serem destinados ao MEC. “A gente não está entrando para pegar dinheiro de outras áreas, é recurso previsto. A previsão, pelo modelo atual de exploração, é que o recurso começa a crescer a partir de 2021, mas especialmente a partir de 2023, começa a crescer para um volume muito grande”, diz.
Outra fonte de recursos para financiar o aumento da participação federal seriam os fundos constitucionais especiais criados para o desenvolvimento regional. “Eles nunca foram utilizados para essa área estratégica da educação, então o próprio governo federal faz uma sinalização de usar parte desse fundo com o foco em educação”, diz.
A minuta ainda prevê que o próprio governo federal aumente o repasse para o Fundeb com recursos do Tesouro. “Quando o governo coloca que vai priorizar a educação básica, que hoje tem quase 50 milhões de alunos. Existem programas no Ministério da Educação criados há 20 anos, 15 anos, 10 anos ou até recentes, que os estados não fazem questão de receber via FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), eles querem dinheiro na mão para, com a sua autonomia, realizar o trabalho. Hoje, o MEC é um balcão, você se apresenta no bar, não tem um critério para dizer ‘olha, o município A vai receber R$ 15 milhões, duas escolas ou três creches’. Você tem caso de cidades com 4 mil habitantes que têm duas creches e municípios de 50 mil em que nenhuma creche foi autorizada ainda. O que nós precisamos é de definição, porque, na parte de financiamento, depois que você criou a despesa e a demanda, não tem como dizer ‘não vou mais mandar o dinheiro’. A escola foi aberta, o serviço foi criado. Por exemplo, os municípios que entram na campanha do governo federal e começam a funcionar o tempo integral. Aí, depois de dois anos, o governo diz ‘não vou mais financiar isso’. Mas existe uma demanda em andamento. Tudo isso está em discussão”, explica.
A deputada diz que o texto ainda está tramitando na Comissão Especial da Câmara e que só depois de aprovado nessa instância será encaminhado para ser votado em plenário, em dois turnos. Aprovada na Câmara, a PEC vai ao Senado, onde também precisa ser aprovada em dois turnos, mas sem a necessidade de passar por uma comissão especial. Ela diz ainda que há mudanças que estão em estudo que precisarão ser regulamentadas por legislação posterior, porque nem todos os temas são matéria constitucional.
Dorinha diz que este movimento de consolidar o texto entre as duas Casas, que está sendo construído em conjunto com o gabinete do senador Arns desde abril, tem o objetivo de elaborar um texto que chegue ao Senado em condições de ser aprovado, ressalvando, a possibilidade de apresentação de emendas.
Ela diz que apresentou o texto no início de outubro para o Fórum dos Governadores e que foi selado, na ocasião, um acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que a PEC seja votada ainda em 2019 na Câmara. “A ideia é enviar esse ano para o Senado para que eles possam aprovar até, no máximo, meados de maio. O que estaria em um bom tempo. Ainda em tempo de elaborar as LDOs dos entes federados, de trabalhar para a elaboração da lei orçamentária. Acredito que a tramitação pode até ser mais rápida, dependendo do envolvimento agora do próprio governo nessa construção acordada, o que não é fácil, porque o governo está com uma série de desafios internos”, diz.
A deputada avalia que a maior dificuldade para aprovação da proposta, no momento, é o governo federal. “Falando de maneira bem clara, praticamente todas as instituições e entes federados já manifestaram apoio formal ao texto. Secretários municipais e estaduais, associações de prefeitos, fórum de governadores. Várias instituições sugerem um ajuste ou outro, mas nada estrutural. O maior desafio nosso vai ser o governo federal dizer como e quanto ele pode colocar, porque, na verdade, a movimentação maior vai ser do governo federal. Eu acho que as bancadas vão estar muito monitoradas por esses acordos”, afirma. “Mas, ao mesmo tempo que existe esse discurso e até ações muito concretas de reorganização do País, há setores do governo federal que defendem um estado menor, que querem desvincular dinheiro da saúde da educação. São posições políticas muito perigosas e arriscadas, mas existem. Por isso não tenho me furtado de ir aos estados para que todo mundo conheça o debate”, complementa.

Confira os principais pontos da minuta:

— Pelo menos 70% dos recursos do Fundeb, em cada estado, serão destinados ao pagamento de professores da educação básica em efetivo exercício. Atualmente, o fundo prevê 60% para remuneração dos profissionais do magistério;
— Os recursos para Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) e salário-educação (tributo federal transferido para os municípios) não poderão ser usados para pagar aposentadorias e pensões;
— A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios terão que aplicar na educação pública, no mínimo, 75% dos royalties da exploração mineral, incluídas as de petróleo e gás natural;
— Para evitar desmonte do Fundeb, que está baseado em vinculação de impostos, em caso de reforma tributária os recursos para educação não poderão ser reduzidos;
— Para aumentar os recursos das redes de educação pública mais vulneráveis, a distribuição da complementação da União deverá considerar o nível socioeconômico dos educandos;
— Não poderá haver supressão ou diminuição de direitos a prestações sociais educacionais;
— Para facilitar o acompanhamento dos recursos investidos em educação, os estados, o Distrito Federal e os municípios disponibilizarão todas as suas informações contábeis, orçamentárias e fiscais, conforme um modelo a ser definido pelo governo federal. Quem não cumprir a regra não poderá receber transferências voluntárias ou contratar operações de crédito;
— A Lei disporá sobre a fórmula de cálculo do custo aluno qualidade, considerando variedade e quantidade mínimas de insumos indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem.

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